Growing up!

Aqui você encontrará meus delirios socráticos, minhas opiniões sobre assuntos diversos e obvio, um pouco da minha percepção de mundo. Tiago de Souza

sexta-feira, novembro 27, 2009

............Ziiiiiiiiiip


Poucas coisas na vida me trazem mais dificuldade do que escolher um presente.
Já tentei assustar, já tentei inovar, já tentei surpreender, mas todos os presentes que eu dou me parecem ser despropositados, sem graça ou no minimo previsíveis. MAs assim que eu vejo um sorisso como resposta eu me aquieto e penso: "Ufa... gostou... "

Mas isso não quer dizer que eu não saiba o que EU NÃO goste da ganhar.

Não sou de ganhar muita coisa. E também não sei fazer joguinho pra ganhar. Existem pessoas que fazem bem aquele papel de "Puxa... queria tanto isso..." ou então conseguem mandar aquele olhar de "Admirador de Vitrine de Loja", mas, eu não sei.
Até que sou bem facil de decifrar nesse aspecto. É só a pessoa notar alguns sinais, algumas citações e... pronto.

Mas isso não quer dizer que eu não saiba o que EU NÃO goste da ganhar.

Quando criança odiava ganhar roupas. Como toda criança queria brinquedos. Me lembro que meu tio uma vez me deu uma mesa de futebol de botão. Eu pulei de alegria. Coisas de comer não são presente, mas mesmo assim eu ganhava. Claro que devorava tudo, mas não era a mesma coisa que ganhar um boneco do He-Man ou um Lango-Lango. Quando eu via o pacote de presente "molinho" já sabia que era roupa e por dentro ficava "Legal legal... mas é roupa... eu não posso mostrar isso para os meus amigos...".
Dias atrás eu fiquei pensando nisso porque uma colega minha me fez a seguinte pergunta:
-Tiago, o que eu dou para o meu namorado de presente?
Eu que as vezes sou extremamente idiota e inconveniente ao invés de ajudar a menina passei a enumerar o que eu NÂO gosto de ganhar e alocando nessa categoria todos os homens do mundo. Discorri sobre a tristeza que acomete o espírito do mais romântico dos homens ao se deparar com um pacote de meias e ter que dar um sorriso extremamente forçado acompanhado de um estalinho e mandar um ""Poxa... era disso que eu precisava..." sem o menor pingo de verdade. Falei sobre lenços, gravatas, chaveiros (se bem que depende do chaveiro por que a Carol me deu é NA MORAL!!), canetas, kit "for Men" com cortador de unha, barbeador e creme de barbear... esbravejei absurdos sobre distintas damas que dão agendas para seus dignissimos respectivos. SInceramente, agenda é o fim. Sei que é um objeto extremamente util, mas agenda deve ser comprado pela propria pessoa e não por outra. Eu não quero ganhar agendas assim como não quero ganhar convite pro novo orkut. Não quero cds da coleção perfil , não quero uma pasta executiva, não quero livros do Augusto Cury e muito menos livros escritos por espíritos. Nada contra quem lê -conheço uma pessoa fantástica da qual eu gosto muito (Õ minha japamarlinda!!! ) que le livros de Gasparzinhos, mas como já disse sobre os chaveiros, existem exceções. Ela gosta do livro não pelo fato de ter sido escrito por um fugitivo dos caça-fantasmas, mas sim pelas idéias que eles podem passar- mas pensa bem: se eu vivo nunca escrevi nada de bom, só a morte pra despertar o Shakespeare que estava escondido em mim? Morte ao PAulo Coelho agora. Eu voto.

É claro que eu já ganhei tudo isso e sempre que isso acontece faço um favor para a pessoa que me deu reproduzindo todo aquele ritual que eu descrevi acima (olhar de supresa+sorriso amarelo+resposta fajuta+abraço afastado+virada de costas+voltar pela raia 2) e um favor a mim mesmo entregando isso para o meu querido pai que usa tudo sem reclamar. Sabe por quê? porque eu simplesmente jogo na gaveta dele e ele usa sem perceber que "ganhou" aquilo.

Depois disso tudo, ela me disse que já tinha comprado um presente para o seu "mozinho".

Uma mochila.

Eu dei uma risada fora do comum. Sabe aquela que vem depois de um silencio e que você começa pelos olhos e fazendo uma pressão pra que ela saia como uma rajada de "HUhhraaaa-ha-ha-ha-haaaaaaaa"?
Pois é! foi desse tipo.
Eu começei a dizer que mochila também era um "tipo de presente sem graça", que "ele iria odiar", que "homem nenhum gosta de ganhar mochila", "que tosco!", "hahaha! com tanto presente você foi escolher esse"... falei várias coisas do tipo. Ela obviamente não gostou muito disso e junto com sua fiel amiga começou a tentar virar o jogo dizendo que eu era um idiota, que eu não sabia de nada, que eu era um frustrado por que também devia ter ganhado uma mochila, que eu nuna levava dinheiro para ajudar na vaquinha do lanche (por quê mulheres sempre jogam outro assunto quando estão no meio de uma discussão? Tá ai uma boa pergunta...). Prontamente rebati dizendo que se elas notassem bem, todas as mochilas são sujas por que os homem nenhum gosta de limpar as mochilas, asseverando assim meu pensamenteo fabuloso de que "Homem não gosta de mochilas".
Nesse momento eu parei.
Elas continuaram a falar, claro... Mas foi como se uma ficha caisse, melhor! como seu minha cabeça tivesse um zíper como de uma mochila e ele se abrisse para uma grande idéia: os homens na realidade tem uma relação de amor com suas mochilas e no fundo no fundo, eles gostam delas! até mesmo de ganhá-las!
Sim! era verdade!
Pense bem: porque dificilmente os homens não lavam suas mochilas? Porque elas tem que ter as marcas do caminho que este "grande homem" trilha! Sim! É isso! Pense bem: uma mochila limpa não é uma mochila legal... assim como um all star limpo não é um ALL STAR. Uma mochila suja mostra que a pessoa é descolada, que ela tem estilo, que ela rala mesmo, que ela está numa batalha por algo, ela está numa Cruzada! Assim como os médicos da Idade Média mantinham seus aventais sujos de sangue para demonstrar experiência, nós, homens do 21 temos que deixar nossas mochilas sujas para que as pessoas em volta saibam quem temos uma boa kilometragem. Sim, nos temos algo a contar, baby... Quer saber o que somos? olhe nossas mochilas... Quer saber o que pensamos? mochilas. Vê essa marca de caneta? Vê essa mancha de barro? Vê esse zíper que não fecha? e esse jeans batido? essa alça rasgada? Can you see? Tudo isso sou eu.
O homem do 21 quando coloca sua mochila se assemelha a um guerreiro que vai pra luta. Podemos notar que quando se coloca uma mochila nas costas se tem todo um jogo de representações, é quase jungiano: uma mochila muito no alto das costas demonstra alguém meio tosco, um pouco bobão; muito lá em baixo, alguém largadão...; alguém que anda com uma mochila num apoiada só braço geralmente tem um olhar aguçado ao que acontece ao seu redor; mochila na frente é medo, na certa; mochila na cabeça é maluco, corre; mochila cruzada nas costas é alguém que passa uma imagem meio "tô nem ai", mas que pode ser entendida como um "olha como sou destemido andando nas ruas dessa metrópole"; mochila na mão é peso ou preguiça e por ai vai. O homem se "empostura" quando coloca uma mochila, ele se ergue, ele não se arqueia, ele é como um guerreiro e sua couraça, como um samurai que coloca sua trouxa de roupas nas dobras do seu quimono. Napoleão devia ter uma mochila, Hitler devia andar com uma na cabeça. Sempre que um personagem parte para uma viagem lá está ela. Surrada, maltratada, sebenta, melequenta, a séculos sem banho... o unico banho permitido a uma mochila de um homem do 21 é o que vem da agua da chuva. Essa sim, é agua de muita macheza! Mochila que nunca levou banho é como um garoto que nunca recebeu um toco de uma menina, ou seja, não vive grandes emoções nem tem lições para deixar para alguém. Mochila tem que ter marca de canetinha, tem que ter uma alça amarrada igual cadarço, tem que ter uma alça quase arrebentando- ela vive um complexo jogo de vida e morte-, tem que ter dentro coisas que o homem do 21 não se lembra: fatura pagas, papeis de rascunhos a muito esquecidos, telefones que não se sabe de quem são, restos de papel de bala, biscoito, aquelas bordas de folha de caderno picotadinhas, bolsos que não se sabe quando foram abertos pela ultima vez...
Por isso, as mochilas são tão especiais. Mesmo quando uma nova chega, o homem do 21 prontamente a adota pois ela fecha um ciclo. Um recomeço. Um eterno dervir. Mas a essência da mochila primal ainda está lá, pronta para ganhar as ruas. Ele não se chateia quando ganha uma, mesmo q o ritual descrito acima se repita. Quando ele tira tudo de uma e passa pra outra, quando ele vê a antiga murcha e a outra em pé como um robô novinho em folha ele contempla a seu novo amigo e lá no seu inconsciente (aquele do Jung, o coletivo) ele diz:

-Seja bem vindo, meu toddynho companheiro de aventuras.


Por isso, meninas, dêem mochilas!
Mas nos também gostamos de blusas do nosso time favorito, cds, dvds, livros...

Mas isso, é um outro texto.


Growing Up young man!

* Dedico esse texto a Si, a Ju e a Gi. Sim, foram elas que não sabiam o que dar a seus respectivos. A Ju não por que não pode namorar. É muito novinha.
** Os unicos que usam mochilas limpas são os advogados, e tirando raras exceções estão todos na categoria dos que usam "mochilas no alto das costas". Toscos.

quarta-feira, novembro 11, 2009

One by One


Engraçado como algumas lembranças costumam nos rodear e na primeira oportunidade, nos laçam...

Em meados da decada de 90 (acho que lá pelo ano de 1996-97), meu pai numa de suas viagens, me trouxe um cd. Sinceramente, não dei muita bola pro presente, e até mesmo meu pai deve tê-lo comprado sem maiores explicações. Era um cd com cara desses de banca de jornal, tipo coletênea, ou então algum disco obscuro de algum artista igualmente obscuro que era colocado com um jornal pra poder dar um "UP" nas vendagens.

O cd em questão era de um cara chamado Winton Marsallis. Tinha um trumpete na capa. E o titulo era "The Jazz Masters".

-Legal! - É o que provavelmente eu tenha falado pro pai, e realmente, achei um presente legal, pois meu pai quando trazia um cd ou era de grupos tipo "brega gospel" ou então era uma daquelas coletaneas insuportáveis dos índios mexicanos (ou seriam chilenos? bolivianos?!?!). O cara gosta dessas coisas! Vai entender...
Coloquei o cd no player, era de noite... -Meu pai nessa época trabalhava numa plataforma no meio do mar (literalmente no meio do nada... só que com água) e passava um mês na agua (entendam, na plataforma) e outro em casa- e ouvi a primeira música: One by One. Naquela época eu não tocava bateria ainda, mas por algum motivo que entendi depois, olhei o nome do baterista na contracapa do cd: Art Blakey.
-Hum... Art Blakey.
O cd ficou esquecido por um tempão aqui em casa.
Um dia, um colega músico me pediu o cd emprestado: disse que não tinha muito material pra ouvir e eu, ainda não estava vacinado quanto a isso, inocentemente emprestei.

Nunca mais vi o cd.

Depois de um tempo, começei a me interessar por bateria, começei a tocar (e pra meu desespero atual, só resolvi estudar um bom tempo depois) e novamente me deparei com aquele nome.

Art Blakey.

Me lembrei do cd. Merda! Cadê ele?!?! Cadê ele?!?!?
Procurei na net, blogs, sites, loja... e nada. Uma unica vez apareceu um link no megaupload, mas infelizmente ele estava expirado.

2009.
Estou eu em São Paulo, andando numa rua que é um dos paraisos do musico aqui no Brasil: a Teodoro Sampaio. Como ainda era cedo, eu estava fazendo hora pra poder ter aula mais tarde. Entro numa loja de cds e sem querer me deparo com o quê?

Winton Marsallis. Jazz masters. One by one. Art Blakey.
Estranho, como algo que aconteceu a mais de 10 anos atrás ainda estava preso no meu subconsciente. Me lembrei de tudo. Do rosto do meu pai me dando o cd com aquele sorrisão, eu batendo na tampa do player pra ele poder "ler" o cd, as frases da mão esquerda do Art Blakey... eu lembrava até das frases do improviso do Marsallis!
Aquele cd poderia custar 100 reais que eu compraria.
Custava 12.

As vezes, o que é importante custa tão pouco que não nos damos nem ao luxo de pagar por isso.
Mas eu paguei. e no débito! ;)

Growing Up.

domingo, novembro 01, 2009

A partida da morte.


A história do futebol mundial inclui milhares de episódios emocionantes e comovedores, mas seguramente nenhum seja tão terrível como o protagonizado pelos jogadores do Dinamo de Kiev nos anos 40. Os jogadores jogaram um partida sabendo que se ganhassem seriam assassinados e, no entanto, decidiram ganhar. Na morte deram uma lição de coragem, de vida e honra, que não encontra, por seu dramatismo, outro caso similar no mundo.


Para compreender sua decisão, é necessário conhecer como chegaram a jogar aquela decisiva partida, e por que um simples encontro de futebol apresentou para eles o momento crucial de suas vidas.

Tudo começou em 19 de setembro de 1941, quando a cidade de Kiev (capital ucraniana) foi ocupada pelo exército nazista, e os homens de Hitler aplicaram um regime de castigo impiedoso e arrasaram com tudo. A cidade converteu-se num inferno controlado pelos nazistas, e durante os meses seguintes chegaram centenas de prisioneiros de guerra, que não tinham permissão para trabalhar nem viver nas casas, assim todos vagavam pelas ruas na mais absoluta indigência. Entre aqueles soldados doentes e desnutridos, estava Nikolai Trusevich, que tinha sido goleiro do Dinamo.

Josef Kordik, um padeiro alemão a quem os nazistas não perseguiam, precisamente por sua origem, era torcedor fanático do Dinamo. Num dia caminhava pela rua quando, surpreso, olhou um mendigo e de imediato se deu conta de que era seu ídolo: o gigante Trusevich.

Ainda que fosse ilegal, mediante artimanhas, o comerciante alemão enganou aos nazistas e contratou o goleiro para que trabalhasse em sua padaria. Sua ânsia por ajudá-lo foi valorizado pelo goleiro, que agradecia a possibilidade de se alimentar e dormir debaixo de um teto. Ao mesmo tempo, Kordik emocionava-se por ter feito amizade com a estrela de sua equipe.

Na convivência, as conversas sempre giravam em torno do futebol e do Dinamo, até que o padeiro teve uma idéia genial: encomendou a Trusevich que em lugar de trabalhar como ele, amassando pães, se dedicasse a buscar o resto de seus colegas. Não só continuaria lhe pagando, senão que juntos podiam salvar os outros jogadores.

O goleiro TrusevichO arqueiro percorreu o que restara da cidade devastada dia e noite, e entre feridos e mendigos foi descobrindo, um a um, a seus amigos do Dinamo. Kordik deu trabalho a todos, se esforçando para que ninguém descobrisse a manobra. Trusevich encontrou também alguns rivais do campeonato russo, três jogadores da Lokomotiv, e também os resgatou. Em poucas semanas, a padaria escondia entre seus empregados uma equipe completa.

Reunidos pelo padeiro, os jogadores não demoraram em dar o seguinte passo, e decidiram, alentados por seu protetor, voltar a jogar. Era, além de escapar dos nazistas, a única que bem sabiam fazer. Muitos tinham perdido suas famílias nas mãos do exército de Hitler, e o futebol era a última sombra mantida de suas vidas anteriores.

Como o Dinamo estava enclausurado e proibido, deram um novo nome para aquela equipe. Assim nasceu o FC Start, que através de contatos alemães começou a desafiar a equipes de soldados inimigos e seleções formadas no III Reich.

Em sete de junho de 1942, jogaram sua primeira partida. Apesar de estarem famintos e cansados por terem trabalhado toda a noite, venceram por 7 a 2. Seu seguinte rival foi a equipe de uma guarnição húngara, ganharam de 6 a 2. Depois meteram 11 gols numa equipa romena. A coisa ficou séria quando em 17 de julho enfrentaram uma equipe do exército alemão e golearam por 6 a 2. Muitos nazistas começaram a ficar chateados pela crescente fama do grupo de empregados da padaria e buscaram uma equipe melhor para ganhar deles. Trouxeram da Hungria o MSG com a missão de derrotá-los, mas o FC Start goleou mais uma vez por 5 a 1, e mais tarde, ganhou de 3 a 2 na revanche.

Em seis de agosto, convencidos de sua superioridade, os alemães prepararam uma equipe com membros da Luftwaffe, o Flakelf, que era uma grande time, utilizado como instrumento de propaganda de Hitler. Os nazistas tinham resolvido buscar o melhor rival possível para acabar com o FC Start, que já gozava de enorme popularidade entre o sofrido povo refém dos nazistas. A surpresa foi grande, porque apesar da violência e falta de esportividade dos alemães, o Start venceu por 5 a 1.

Depois dessa escandalosa queda do time de Hitler, os alemães descobriram a manobra do padeiro. Assim, de Berlim chegou uma ordem de acabar com todos eles, inclusive com o padeiro, mas os hierarcas nazistas locais não se contentaram com isso. Não queriam que a última imagem dos russos fosse uma vitória, porque acreditavam que se fossem simplesmente assassinados não fariam nada mais que perpetuar a derrota alemã.

A superioridade da raça ariana, em particular no esporte, era uma obsessão para Hitler e os altos comandos. Por essa razão, antes de fuzilá-los, queriam derrotar o time em um jogo.

Com um clima tremendo de pressão e ameaças por todas as partes, anunciou-se a revanche para 9 de agosto, no repleto estádio Zenit. Antes do jogo, um oficial da SS entrou no vestiário e disse em russo:

- "Vou ser o juiz do jogo, respeitem as regras e saúdem com o braço levantado", exigindo que eles fizessem a saudação nazista.

Já no campo, os jogadores do Start (camisa vermelha e calção branco) levantaram o braço, mas no momento da saudação, levaram a mão ao peito e no lugar de dizer: - "Heil Hitler!", gritaram - "Fizculthura!", uma expressão soviética que proclamava a cultura física.

Os alemães (camisa branca e calção negro) marcaram o primeiro gol, mas o Start chegou ao intervalo do segundo tempo ganhando por 2 a 1.

Receberam novas visitas ao vestiário, desta vez com armas e advertências claras e concretas:

- "Se vocês ganharem, não sai ninguém vivo". Ameaçou um outro oficial da SS. Os jogadores ficaram com muito medo e até propuseram-se a não voltar para o segundo tempo. Mas pensaram em suas famílias, nos crimes que foram cometidos, na gente sofrida que nas arquibancadas gritava desesperadamente por eles e decidiram, sim, jogar.

Deram um verdadeiro baile nos nazistas. E no final da partida, quando ganhavam por 5 a 3, o atacante Klimenko ficou cara a cara com o arqueiro alemão. Deu lhe um drible deixando o coitado estatelado no chão e ao ficar em frente a trave, quando todos esperavam o gol, deu meia volta e chutou a bola para o centro do campo. Foi um gesto de desprezo, de deboche, de superioridade total. O estádio veio abaixo.

Como toda Kiev poderia a vir falar da façanha, os nazistas deixaram que saíssem do campo como se nada tivesse ocorrido. Inclusive o Start jogou dias depois e goleou o Rukh por 8 a 0. Mas o final já estava traçado: depois dessa última partida, a Gestapo visitou a padaria.

O primeiro a morrer torturado em frente a todos os outros foi Kordik, o padeiro. Os demais presos foram enviados para os campos de concentração de Siretz. Ali mataram brutalmente a Kuzmenko, Klimenko e o arqueiro Trusevich, que morreu vestido com a camiseta do FC Start. Goncharenko e Sviridovsky, que não estavam na padaria naquele dia, foram os únicos que sobreviveram, escondidos, até a libertação de Kiev em novembro de 1943. O resto da equipe foi torturada até a morte.

Ainda hoje, os possuidores de entradas daquela partida têm direito a um assento gratuito no estádio do Dinamo de Kiev. Nas escadarias do clube, custodiado em forma permanente, conserva-se atualmente um monumento que saúda e recorda àqueles heróis do FC Start, os indomáveis prisioneiros de guerra do Exército Vermelho aos quais ninguém pôde derrotar durante uma dezena de históricas partidas, entre 1941 e 1942.

Foram todos mortos entre torturas e fuzilamentos, mas há uma lembrança, uma fotografia que, para os torcedores do Dinamo, vale mais que todas as jóias em conjunto do Kremlin. Ali figuram os nomes dos jogadores. Abaixo a única foto que se conserva da heróica equipe do Dinamo e o nome de seus jogadores.

Goncharenko e Sviridovsky, os únicos sobreviventes, junto ao monumento que recorda a seus colegas.

Na Ucrânia, os jogadores do FC Start hoje são heróis da pátria e seu exemplo de coragem é ensinado nos colégios. No estádio Zenit uma placa diz "Aos jogadores que morreram com a cabeça levantada ante o invasor nazista".

Esta é a história da dramática "Partida da Morte". O cineasta John Huston inspirou-se neste fato real para rodar seu filme "Fuga para a vitória" (Escape to Victory) de 1982 que chamou muita atenção à época do lançamento porque dele participaram grandes nomes do cinema como Michael Caine, Sylvester Stallone e Max Von Sydow, mas muito mais pela participação de algumas estrelas do futebol, como Bobby Moore, Osvaldo Ardiles, Kazimierz Deyna e Pelé. No filme John Huston fez o que não pôde o destino: salvar os heróis.


Créditos: http://blogduchicao.blogspot.com/